terça-feira, 4 de janeiro de 2011

mãe?


Mamãe sempre foi uma executiva muito ocupada. A sua rotina era a mesma, desde que eu me lembro. Ela acordava, tomava uma xícara de café enquanto lia o jornal, se arrumava com seus terninhos, prendia um coque na cabeça, e ia trabalhar. Só voltava tarde, quando eu já estava indo dormir. Eu a admirava muito. Dizia que quando eu fosse maior, ia querer ser que nem ela. Quando ela não estava em casa, ia no seu quarto, pegava algumas roupas, alguns sapatos e ficava brincando de executiva. Se bem que eu não sabia muito bem o que era ser, de fato uma. Eu ficava apenas dando ordens para leo e jonh, meus bichinhos de pelúcia. Às vezes dava ordem para minhas barbies também. A questão é que conforme eu ia crescendo, menos minha mãe ficava presente em minha vida. E aquela graça, de ver minha mãe saindo cedo todas as manhãs e voltando tarde todas as noites, estava se perdendo. Eu estava sentindo falta dela. De uma mãe. De alguém para contar sobre meus romances. Sobre minha primeira menstruação. Sobre tpm. De uma mãe para fazer compras comigo, me levar ao salão de beleza. De uma mãe presente, coisa que toda menina precisa, principalmente na adolescência. O tempo foi passando, e eu tive, finalmente coragem de ir falar com ela. Tentar resolver tudo. Entrei em seu quarto, numa noite em que ela havia chegado mais cedo. Achei que estaria vendo televisão, ou descansando. Mas não. Estava ela, no computador e no telefone, trabalhando. Quase desisti, mas veio em minha mente o dia em que eu dei meu primeiro beijo, e quando fui contar para ela, ela pouco se importou, já que estava fazendo relatórios e dando telefonemas. -Mãe, eu queria conversar com você. Será que dá pra ser agora? -Um minutinho filha, estou trabalhando. Sentei em sua cama, e dali só sairia depois de desabafar tudo. -Sabe mãe, quando eu era menor, eu adorava ver você nessas roupas, trabalhando muito. Até queria ser igual. Mas eu cresci, e preciso de uma mãe. Disse tudo que estava preso dentro de mim. Até que reparei que ela estava olhando para mim. Será que eu havia conseguido, finalmente, sua atenção? -Eu te amo mãe, e preciso de você. - eu disse, e sai do quarto. Segui para a sala, e liguei a televisão. Será que ela iria mudar? Será que finalmente iria perceber que tinha uma filha? Algumas lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto, e de repente, ela apareceu ali.
-Eu não esperava te ver aqui tão cedo. Quer conversar, mãe? - disse eu, limpando as lágrimas, e estampando um sorriso imenso em meu rosto.
-Margarett! Você viu onde deixei minha bolsa? Não estou a encontrando e preciso dela agora.- ela berrou. Margarett era a moça que trabalhava lá em casa.
Margarett chegou correndo na sala, com a bolsa de minha mãe nas mãos. Ambas deixaram o cômodo, sem nem falar uma palavra comigo. Elas me deixaram ali, sozinha, decepcionada.
É, acho que minha mãe não escutou uma única palavra que eu disse. Acho que terei que me contentar em contar sobre meus problemas amorosos para o meu pai, que pelo menos se interessa em me escutar.

(48ª edição conto/história - Projeto Bloínquês - 4° lugar)

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